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A necessidade de distribuição de medicamentos à base de canabidiol pelo Sistema Único de Saúde (SUS) foi debatida em audiência pública da Comissão de Saúde da Alepe, na segunda, 20 de novembro. O canabidiol ou CBD é uma substância extraída da cannabis sativa, a planta da maconha, e utilizada para fins medicinais.

Em 2015, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) classificou o canabidiol como substância controlada, e não mais como proibida, mas o plantio segue vetado no País. A Justiça concede autorizações pontuais, a pacientes ou associações, destinadas ao uso medicinal.

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No encontro da Alepe, mães de crianças que fazem uso do óleo de CBD relataram os progressos conquistados com o tratamento. A pedagoga Luzélya Saraiva, de Parnamirim, no Sertão Central, é mãe de Melinda, de quatro anos, que tem autismo. Ela informou que conseguiu o fornecimento da medicação, que tem custo elevado, junto à Prefeitura do município.

“Minha filha perdeu a fala e outras habilidades que havia adquirido. Com apenas 30 dias de uso do canabidiol, ela voltou a falar e fazer contato visual. Ela usa há um ano e vem tendo melhorias desde então”, afirmou.

A advogada Mônica Araújo percebeu a evolução no desenvolvimento da filha, Laura, também diagnosticada com autismo, após começar a utilizar o óleo. As possibilidades de acesso da família ao medicamento, no entanto, foram outras.

“Eu busquei um médico de outro Estado e consegui importar o óleo de canabidiol. As histórias das mães de crianças atípicas são muito parecidas, a diferença é o acesso ao tratamento”, observou. “O trabalho das associações que produzem e distribuem essa medicação é muito importante, mas chega um momento em que o Estado precisa assumir a responsabilidade”, avaliou a advogada.

Muitos estudos científicos comprovam a eficácia do canabidiol no tratamento de diversas doenças, como apontou o médico Wilson Freire, que atua no Hospital Oswaldo Cruz e dedica-se à pesquisa do uso medicinal da substância. “Epilepsia, dores crônicas, Parkinson, Alzheimer, insônia e ansiedade são alguns dos casos em que é recomendado o CBD.

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A cada dia percebemos o aumento do número de pacientes em busca desse tratamento, o que demonstra o desejo da população e a importância de o Estado fornecer essa assistência”, pontuou.

Em Pernambuco, o Projeto Cannabis, da UFPE, busca implementar no Laboratório Farmacêutico do Estado (Lafepe) a produção do óleo de canabidiol, para distribuição pelo SUS. Responsável pela área comercial da iniciativa, Alberto Fernandes destacou que 430 mil brasileiros já utilizam o produto. Ele apresentou o potencial desse mercado.

“Em 2018, o faturamento foi de R$ 430 milhões no país. A previsão para este ano é de R$ 1,8 bilhão e, havendo regulamentação para a produção no país, a projeção para daqui a quatro anos é de R$ 9,5 bilhões”, ressaltou.

Preconceito 

O combate ao preconceito em relação ao canabidiol e à estigmatização das pessoas que fazem uso dele foi um ponto destacado no encontro. Para o deputado João Paulo (PT), é preciso superar essa discussão e enxergar todos os benefícios que a exploração da planta pode oferecer.

“Além do alívio do sofrimento de pacientes e das famílias, que se sacrificam muito, a cannabis pode ser fonte de desenvolvimento industrial, gerando emprego e renda, inclusive com a fabricação têxtil”, salientou.

O empresário André Davi reforçou a diferenciação do uso medicinal do CBD em relação ao uso recreativo da maconha.

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“O componente da planta que pode causar alteração de consciência é o tetrahidrocanabinol (THC). Hoje existem sementes europeias, certificadas, sem essa substância”, assegurou.

Ele também destacou que, ainda que haja a incorporação do CBD ao SUS, seria preciso recorrer à importação do produto, pois a produção brasileira não seria suficiente para cobrir a demanda.

“É fundamental que o óleo distribuído pelo SUS seja proveniente do cultivo nacional, e até que isso ocorra vão ser necessários pelo menos cinco anos, para baratear o medicamento”, alertou.

O encontro foi solicitado pelo deputado Luciano Duque (Solidariedade), que presidiu a audiência. Ele ressaltou o esforço legislativo em torno do tema, em todo o Brasil.

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“Pelo menos 25 Estados já aprovaram ou estão debatendo a questão, mas a dificuldade de acesso aos medicamentos persiste. Há uma proposta no Senado, para incluir o óleo de canabidiol no SUS; outra na Câmara Federal, para facilitar a comercialização”, destacou o parlamentar.

Em 2022, a Alepe aprovou a Lei nº 18.124/2022, de iniciativa do deputado João Paulo, que regulamenta o cultivo e o processamento da cannabis no Estado para fins medicinais, veterinários e científicos, por associações de pacientes, nos casos autorizados pela Anvisa e pela legislação federal.

Já o Projeto de Lei nº 474/2023, de autoria do deputado Luciano Duque, busca instituir a Política Estadual de Fornecimento Gratuito de Medicamentos Formulados à Base de Canabidiol, nas unidades de saúde conveniadas ao SUS em Pernambuco.

Representante da Secretaria Estadual de Saúde, o diretor de Assistência Farmacêutica Jean Batista de Sá lembrou que outros Estados têm enfrentado dificuldades para implantar a distribuição pelo SUS.

“Processos licitatórios em outras unidades da Federação têm fracassado. É importante criar uma lei que permita a execução, para não frustrar a expectativa dos pacientes”, frisou o gestor.

Ainda na reunião, o deputado João Paulo anunciou a apresentação de um requerimento para criação de uma Frente Parlamentar dedicada ao uso do canabidiol em Pernambuco. Luciano Duque reafirmou o compromisso com essa questão.

“Não há como voltar atrás, diversos estudos comprovam a eficácia do CBD. Cabe a nós buscar condições de igualdade para quem precisa adquiri-lo”, afirmou.

Também participaram do encontro representações da UPE, UFRPE, OAB-PE e diversas associações, como a Amme Medicinal, Aliança Medicinal, Cannape, entre outras.