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MPF pede condenação de 37 ex-agentes da ditadura no caso Marighella

Marighella dirigia a Aliança Libertadora Nacional (ALN), organização de resistência armada à ditadura, e era considerado o "inimigo público número 1" do regime militar.

10 SET 2024 • POR Fernanda Diniz • 13h30
Caso Marighella.   Foto: Divulgação

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma nova ação civil pública para que 37 ex-agentes da ditadura sejam responsabilizados na esfera cível pela execução de Carlos Marighella, um dos mais destacados opositores do regime militar, em 1969.

A ação pede, entre outras condenações, que os envolvidos no episódio percam aposentadorias, restituam gastos do Estado brasileiro com indenizações concedidas a familiares da vítima e paguem compensações financeiras por danos morais coletivos que a repressão política causou à sociedade. No caso de réus já falecidos, os herdeiros deverão arcar com as reparações. 

Vários ex-agentes do regime militar já figuram em duas ações civis públicas anteriores que o MPF ajuizou em março e agosto, relacionadas a casos de prisão ilegal, tortura, morte e desaparecimento forçado de outros 34 militantes políticos perseguidos na ditadura.

Parte dos envolvidos no assassinato do ex-deputado federal baiano também foi alvo de uma denúncia protocolada em maio, com pedidos de condenação penal por homicídio qualificado e falsidade ideológica.

A recente ação busca o cumprimento de diversas medidas de preservação do passado e esclarecimento dos fatos ocorridos durante a ditadura. Para isso, o MPF quer que o estado de São Paulo e a União, também réus, sejam obrigados a realizar um ato público de desagravo à memória de Marighella e a incluir informações sobre o caso em espaços de memória dedicados ao período.

Marighella dirigia a Aliança Libertadora Nacional (ALN), organização de resistência armada à ditadura, e era considerado o “inimigo público número 1” do regime militar. Ele foi morto na capital paulista em uma operação arquitetada pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops), em 4 de novembro de 1969. Naquela noite, as equipes da unidade armaram uma emboscada para o militante, o surpreenderam desarmado e, ainda que pudessem levá-lo preso, executaram-no.

Um dos réus é o ex-delegado Sérgio Paranhos Fleury, que comandou a operação. Além dele, são citados na ação do MPF os ex-agentes do Dops: Adusindo Uribe, Alcides Paranhos Junior, Alfeu Forte, Amador Navarro Parra, Antônio Pereira Gomes, Carlos Alberto Augusto, Clarismundo da Silva Filho, Djalma Oliveira da Silva, Edsel Magnotti, Fabio Lessa de Souza Camargo, Francisco Guimarães do Nascimento, Gumercindo João de Oliveira, Henrique de Castro Perrone Filho, Ivahir Freitas Garcia, Izidoro Tescarollo, João Carlos Tralli, João Ribeiro Carvalho Netto, Joaquim Ferreira da Silva Filho, Luiz Antônio Mariano, Luiz Gonzaga Xavier, Luiz Hena, Luiz Zampolo, Mario Rocco Sobrinho, Natal Tuglia, Orlando Rosante, Oswaldo Machado de Oliveira, Paulo Guilherme de Oliveira Peres, Raul Nogueira de Lima, Roberto Guimarães, Rubens Cardoso de Mello Tucunduva, Rubens Pacheco de Souza, Tokioshy Nakahara, Valmor Trevisan, Walter Francisco e Wanderval Vieira de Souza.

Completam a lista de réus o ex-integrante do Instituto Médico Legal (IML) Abeylard de Queiroz Orsini. Ele foi um dos autores do laudo necroscópico que omitiu as verdadeiras circunstâncias da morte de Marighella para endossar a versão oficial de que o militante havia reagido à prisão.

O documento deixou de mencionar sinais da execução sumária, como evidências da curta distância dos tiros e lesões que indicavam a tentativa da vítima de se proteger dos disparos. A prática de forjar laudos era comum no IML de São Paulo, unidade que colaborou ativamente com os órgãos de repressão durante toda a ditadura para encobrir crimes e eximir os agentes de responsabilidade.

A procuradora da República Ana Letícia Absy, autora da ação do MPF, reitera que o contexto de aprovação da Lei da Anistia anula completamente seu valor, apesar de a norma ainda ser evocada para impedir investigações e condenações.

“A lei foi criada apenas para privilegiar e beneficiar os que se encontravam no poder, buscando exatamente atingir o escopo ainda persistente: não haver a punição dos crimes ou ressarcimento dos atos praticados pelos agentes estatais, quando estes saíssem do poder. E até a presente data, infelizmente, está plenamente atingindo seus objetivos”, destacou Absy. 

Agência Brasil