Restrição

Justiça determina interdição de pousada em Fernando de Noronha porque donos não se vacinaram contra a Covid-19

Em decisão interlocutória, o desembargador Erik Simões do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE) manteve, nesta quarta-feira, 19 de janeiro, a interdição de uma pousada localizada em Fernando de Noronha, porque seus proprietários se recusaram reiteradamente a tomar a vacina contra a Covid-19.

Os donos do estabelecimento ingressaram com uma ação na Justiça Pernambucana, para tentar reverter a interdição feita pela Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária (APEVISA), no fim de 2021.

No dia 14 de janeiro, o juiz de Direito André Carneiro de Albuquerque Santana, que atua na Vara Única de Fernando de Noronha, não concedeu medida liminar para os donos da pousada e manteve a interdição do local no mandado de segurança 0000015-19.2022.8.17.3600.

Inconformados com a decisão, os proprietários recorreram ao segundo grau com o agravo de instrumento 0000006-69.2022.8.17.9001, cuja liminar foi negada novamente pelo desembargador.

A segunda decisão pela manutenção da interdição teve como um dos fundamentos jurídicos o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a obrigatoriedade da vacina.

“É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, (i) tenha sido incluída no Programa Nacional de Imunizações ou (ii) tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei ou (iii) seja objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar”, escreveu o desembargador Erik Simões, relator do agravo.

Leia mais:
>>> Bolsonaro fala com donos de pousada interditada em Fernando de Noronha por não se vacinarem contra Covid-19 e garante visita

Nos autos, a APEVISA foi representada pelo Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco (PGE-PE). Na argumentação elaborada pela Procuradoria, enfatizou-se que a continuidade do funcionamento do estabelecimento – prevendo que os sócios/administradores não vacinados permaneçam isolados e sem atuar junto ao público –, além de ofensiva ao ordenamento jurídico, não se mostra adequada do ponto de vista sanitário.

No agravo de instrumento, a defesa da Pousada alegou que a proprietária é hipertensa e a sua filha está grávida e, por isso, optaram por não se vacinar. O argumento não encontra sustentação em base científica, de acordo com a decisão.

“Ocorre que a vacinação para Covid-19 já foi liberada para gestantes desde meados de abril de 2021, de forma segura, e desde o início da vacinação, é altamente recomendado que as pessoas gestantes e/ou hipertensas, que participam do grupo de cidadãos integrantes do grupo de risco, tomem a vacina, pois possuem maior probabilidade de agravamento da doença. Não há nos autos qualquer laudo médico que contraindique a aplicação do imunizante”, analisou o desembargador. 

O magistrado ainda enfatizou que os proprietários de pousadas não podem ter tratamento diferente do que é dado a outras pessoas que moram ou passam pelo local.

“Vale mencionar, inclusive, que desde 1º de outubro de 2021, data de entrada em vigor da Portaria AG/ATDEFN N. 047/2021, está sendo exigido comprovante de vacinação para entrada na ilha, além de exame PCR-RT com 48 horas de antecedência ou exame de busca de antígeno com no máximo 24 horas de antecedência. Assim, diante da especificidade do local, de poucos moradores e rígido controle de entrada, não há razão para que se trate alguns moradores de forma diferente, de modo a impedir que o Poder Público adote medidas indiretas para a aplicação do imunizante”, afirmou o relator 

Por fim, o desembargador avaliou a legalidade do ato administrativo da vigilância sanitária que interditou a pousada.

“Neste caso, o ato impugnado não merece ser afastado, vez que apenas cumpre as medidas determinadas pelo Governo Estadual, competente para tanto, e atende as medidas sanitárias e necessárias à proteção da saúde pública, assegurada constitucionalmente. Ademais, o ato administrativo da vigilância sanitária encontra- se autorizado pela Lei Federal no. 6.437/1977, que, em seu art. 10, inciso VIII, dispõe que são infrações sanitárias “reter atestado de vacinação obrigatória, deixar de executar, dificultar ou opor-se à execução de medidas sanitárias que visem à prevenção das doenças transmissíveis e sua disseminação, à preservação e à manutenção da saúde”, descreveu Simões. 

No primeiro grau, o juiz de Direito André Carneiro de Albuquerque Santana, que atua na Vara Única de Fernando de Noronha, também negou o pedido da Pousada, deixando claro que o direito à saúde se sobrepõe à livre iniciativa.

“A Lei nº 13.979/2000, que especificamente protege o direito à saúde, estipula as medidas que podem ser implementadas pelas autoridades sanitárias, a fim de salvaguardar tão importante patrimônio popular. Entre as medidas que a lei autoriza, estariam a restrição excepcional e temporária, por rodovias, portos ou aeroporto; a locomoção interestadual e intermunicipal; e a vacinação e outras medidas profiláticas. Se a Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária impõe que o atendimento ao público seja feito somente por aqueles que estão devidamente vacinados, e o estabelecimento impetrante não comprova o atendimento às exigências, não me parece ser o caso de concessão de medida liminar. A livre iniciativa há de ser preservada dentro das exigências sociais mais relevantes. Não se poderia, por exemplo, admitir a venda de produtos nocivos à saúde, ou que infringisse a lei. Tudo tem seus limites e, neste caso, a estipulação de vacinação para esse tipo de atividade, atendimento ao público, não aniquila o direito de livre iniciativa. Completo o argumento mencionando que não me parece que o ato atacado esteja eivado de inconstitucionalidade e mereça algum remédio judicial, pois se baseia em diversos atos das autoridades de saúde estadual e nacional, que têm a responsabilidade de estabelecer, dentro dos critérios científicos, quais as medidas adequadas para evitar o contágio e a propagação da doença. Por isto, indefiro a liminar pleiteada”, concluiu na decisão liminar.

TJPE