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Artigo: O Big Brother Brasil e a Opinião Pública – por Jason Medeiros

O programa Big Brother Brasil é transmitido pela Rede Globo desde 2002 e já está na sua 21ª edição.

O seu nome deriva do romance 1984 (1949), escrito pelo britânico Eric Blair (1903-1950), mais conhecido pelo pseudônimo George Orwell. Na grande obra do autor, “Big Brother” (Grande Irmão, na tradução literal, ou Irmão Mais Velho, em linguagem coloquial inglesa) refere-se a um personagem, quase uma entidade onipresente, capaz de observar os cidadãos em todos os lugares, mesmo aqueles mais íntimos e privados. Daí a justificativa para nome do programa que nos coloca na posição do Big Brother para julgar as ações dos confinados e decidir os seus destinos.

Contrariando o senso comum “esclarecido” afirmo sem qualquer ressalva que a premissa do programa é seriamente instigante. Colocar pessoas que possuem visões de mundo distintas, ou mesmo antagônicas, das mais variadas regiões do país, com sotaques próprios, crenças diversas, trejeitos idiossincráticos, realidades sociais dessemelhantes, para conviverem sem contato com o “mundo exterior” por meses, é capaz de proporcionar ao espectador verdadeiras experiências sociológicas e antropológicas.

Todavia gostaria de alertar o leitor que apesar da premissa, não se deve assistir ao reality show com tanta inocência.

Assim como qualquer pessoa física ou jurídica o Grupo Globo possui o seu rol de interesses, sejam eles financeiros ou de qualquer outra espécie, e isso é perfeitamente observável na escolha e no conteúdo das suas matérias publicadas na imprensa, na pauta dos seus programas de entretenimento, na linguagem dos seus telejornais, na contratação dos seus funcionários, nos personagens e histórias das suas novelas, e, com o Big Brother não seria diferente.

É evidente que a produção do BBB escolhe a dedo os participantes do programa para que possa haver engajamento do telespectador. Só assim a emissora poderá justificar a cobrança dos altos valores para as empresas que desejem fazer propaganda no intervalo comercial do show, graças aos altos índices de audiência.

Mas, como já adiantei, não existe apenas o interesse financeiro na jogada. A emissora é claramente alinhada com os “valores” (se é que podemos chamar de valores) “progressistas” (se é que também podemos chamar de progresso) defendidos pela esquerda “liberal” (se é que podemos chamar de liberal). Tudo isso fica muito claro nos ataques proferidos no Jornal Nacional ao atual Governo Federal (Conservador-Liberal), e, no Big Brother, com a escolha dos seus participantes. O poeta e ex-brother Adrilles Jorge comentou sobre isso na Rádio Jovem Pan em 2020 quando questionado se a produção do BBB seria de esquerda:

“Por exemplo, o (BBB) 19 foi assim, pós-eleição do Bolsonaro. Eles colocaram um tanto de ativistas […] Vem do 19 para cá essa tendência a politização. O princípio de politização do BBB começou com a eleição do Bolsonaro. No 19… você lembra o que aconteceu? Eles colocaram vários participantes progressistas, engajados, politizados, alguns partidarizados, todos de esquerda. ”

Os métodos propagandísticos que visam influenciar o debate público são diversos, e normalmente tem em comum a exposição de ideias que afrontam a moral tradicional, muitas vezes sendo apresentadas de forma negativa pelos promotores, apenas para que adentrem no campo da opinião pública, como ressaltado pela cientista política alemã Elisabeth Noelle-Neumann (1916-2010) na obra A Espiral do Silêncio – Opinião Pública: Nosso Tecido Social (1982):

“Gabriel Tarde, ao conceituar opinião, ressalta a característica de existir apenas onde há controvérsia. Temas tabus não são objeto de opinião, já que não há divergência ou opções “sim ou não” disponíveis ou imaginariamente existentes na sociedade. Este é um dos motivos pelos quais os ativistas ou propagandistas de ideias em longo prazo, muitas vezes iniciam um tema pelo contrário do que desejam fazer vigorar. Por exemplo: a pauta internacional da liberação das drogas precisou contar, inicialmente, com uma campanha contra as drogas, de modo a colocar o tema em pauta, romper o tabu do assunto e estimular a divergência para, então, ver surgir opiniões opostas ao simples e óbvio “não”.”.

Portanto, é transparente a tentativa da produção do reality em pautar a moral da sociedade, e não somente representar a polarização política existente nela atualmente, pois, caso fosse isso, a equipe teria escolhido também participantes politicamente engajados do espectro oposto, o que até então não ocorreu.

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O Big Brother Brasil que antes era marcado pelas competições banais de marquinhas de biquíni e peitorais sarados, hoje se distingue pelas batalhas de lacração e olimpíadas da opressão. Celebridades afirmando que os homens/heteros/brancos carregam a culpa das mazelas sociais; homens fantasiados de mulheres sendo acusados de transfobia após demonstrarem não possuir a masculinidade frágil de que também são acusados; pardos se dizendo pretos, e pretos acusando pardos de serem apenas sujos; homens acusando mulheres de racismo por não sentirem atração por eles, e mulheres acusando homens de assédio por flertarem com elas; feministas negras calando feministas brancas que calam homens brancos que as alertam a respeitarem o local de fala dos pretos.

E é dessa forma que o a produção do Big Brother Brasil vem tentando modelar a opinião pública, bombardeando os espectadores com militância identitária exarcebada, suprimindo o contraditório, assim como fazem as Redes Sociais que banem influenciadores que defendem proposições conservadoras, a fim de ampliar o progresso dessas pautas no corpo da sociedade homogeneamente.

Essa atitude da emissora apenas corrobora com a acusação dos conservadores de que a defesa dessas ideias são essencialmente antidemocráticas, pois são segregacionistas, esfacelando o tecido social, e não aceitam argumentos contrários, mesmo as mais estúpidas delas. Até mesmo os simpatizantes da causa entraram em fase de negação, afirmando que esses participantes não representam os seus coletivos e as suas ideias, mas a verdade é que estão assustados agora que estão sendo confrontados consigo mesmos na frente do espelho.

O filósofo brasileiro Mário Ferreira dos Santos (1907-1968) já chamava a atenção para essa tendência de subversão da cultura tradicional por uma elite intelectual no seu manifesto Invasão Vertical dos Bárbaros (1967). Nele, o filósofo explica que diferentemente da invasão horizontal, a invasão vertical “é a que penetra na cultura, solapando seus fundamentos e preparando o caminho à corrupção mais fácil do ciclo cultural, como aconteceu no fim do Império Romano, e começa a acontecer entre nós”.

Encerro, por ora, com a citação do escritor baiano Antônio Risério, que se considera da “esquerda democrática” (se é que isso de fato existe), feita em Sobre o relativismo pós-moderno e a fantasia fascista da esquerda identitária (2020):

“De uns tempos para cá, tanto no cenário político-cultural norte-americano quanto no brasileiro, assistimos à proliferação de ações persecutórias e mesmo truculentas protagonizadas não só pela extrema-direita, mas, para a surpresa de muitos, pela chamada “esquerda identitária”, que se julga moralmente superior ao resto da humanidade. Aqui, quem quer que não concorde in totum com as imbecilidades hoje imperantes, é prontamente atacado com os palavrões agora em voga: homofóbico, racista, misógino, etc. E atacado sem o menor escrúpulo, com desprezo absoluto pela ética e por verdades factuais. Se o atacado quiser argumentar, defender o seu ponto de vista, pior. Identitários não perdem tempo com argumentos e outras bobagens do gênero, desde que andam sempre muito menos interssados em discutir ideias do que sistematicamente empenhados em destruir reputações. E é por isso que berram, alto e mau som, apelando para o que está ao alcance de seus mínimos neurônios, numa carretilha de xingamentos morais absolutamente irresponsáveis, onde “canalha” é das expressões mais leves”

Por: Jason Medeiros

Jason de Almeida Barroso Medeiros, 26 anos, bacharelando em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco; Oficial da Reserva do Exército Brasileiro pelo CPOR/R; Entusiasta da filosofia política e editor do perfil @ocontribuinteoriginal no Instagram.