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Artigo: Corrupção não é doença, é desvio de caráter e da lei. Portanto não é erro, é crime

Há muitos motivos para o sofrimento coletivo em tempos de pandemia. O mais fácil de ver e difícil de conter é o medo da contaminação. Mesmo com um sistema de saúde bem estruturado, países europeus como a Itália e a Espanha tiveram problemas sérios para atender a população, no pico dos casos. Nem toda a riqueza que concentram os norte-americanos têm impedido o alastramento da Covid-19 e a liderança disparada no ranking mundial de mortes nos Estados Unidos. E no Brasil, mesmo com o enfraquecimento do contágio em alguns estados, indicando a estabilização, a retomada das atividades tende a ser lenta, porque o nosso País ainda enfrenta um quadro de calamidade. Com uma m&e acute;dia diária acima de mil óbitos, e a triste perspectiva de atingir a marca de 100 mil vidas perdidas pela pandemia nas próximas semanas.

Neste cenário desafiador, muitas vezes cruzando o limiar do desespero, é digna de aplauso a atuação de profissionais da saúde e de milhares de pessoas abnegadas em várias áreas, servidores públicos ou não, que dedicam parte de seu tempo a cuidar da integridade física e mental de indivíduos infectados e suas famílias. Na maioria das vezes, em condições inadequadas, contando com a sorte e se amparando na fé, dando esperança e conforto a quem precisa. O esforço coletivo conta com a colaboração de gestores públicos sérios, preocupados com a responsabilidade que carregam, conscientes dos possíveis efeitos sobre as decisões que tomam, a partir de escolhas que estão longe de serem fáceis.

Mas o reconhecimento da virtude de tantos não pode fechar os olhos diante do vício de outros. Há um aspecto repugnante da realidade nacional que não deu trégua nem com o advento de uma pandemia. Pelo contrário, mostra sua face inescrupulosa se aproveitando das urgentes demandas de saúde pública, que se multiplicam neste momento. A população exige celeridade nas respostas, porque a vida de muita gente depende de uma corrida contra o tempo. Ao lado de medidas preventivas em larga escala, as ações na ponta do tratamento, depois do contágio, devem primar pela agilidade e pela eficiência. De carona em tais circunstâncias, servidores públicos corruptos podem se ver tentados a ava n&ccedil ;ar no caminho da corrupção, passando por cima de qualquer vestígio de bom senso e humanidade que porventura possuam.

Os órgãos de controle de gastos no Brasil se deparam com um volume inusitado de casos suspeitos, ampliando para além do razoável o arco de preocupações da coletividade. Como se não bastasse o risco de uma doença mortal, o cidadão teme pela integridade do orçamento público, e até, pela veracidade das afirmações e promessas feitas por alguns gestores, postos em xeque por atos duvidosos. Os tribunais de contas e o Ministério Público não se cansam de recomendar cautela e lisura nos processos que envolvem despesas emergenciais com recursos do contribuinte. Mas nenhum alerta parece parar os corruptos. Até a Polícia Federal tem sido acionada, nas últi mas sema nas, fechando o cerco de investigações que têm que ser esclarecidas, em todos os âmbitos possíveis. O cidadão não pode ser vítima duas vezes: da pandemia e da má gestão do dinheiro público.

Corrupção não é doença, é desvio de caráter e da lei. Portanto não é erro, é crime.

Priscila Krause é deputada estadual.