Artigo

Eleições 2020: a Arte de Fazer as Perguntas Certas

Semana passada meu texto aqui foi sobre as eleições municipais de 2020. Vários leitores compartilharam comigo certa preocupação. Temos amigos que tendem a trocar voto por consideração fraterna com quem se candidata em eleições municipais. Após ouvir esses leitores ficou-me a impressão de que o artigo anterior precisava de uma complementação.

Penso que a arte de fazer perguntas tem andado em declínio nos últimos anos. Somos uma geração cheia de afirmações. Muitas opiniões são corroboradas por rasíssimas experiências pessoais.Todavia acreditamos que dar total publicidade de nossos conceitos ao mundo é praticamente obrigatório.

Já que vivemos num mundo bastante acostumado a alegar, e menos afeito a inquirir, vamos trazer essa problemática para avaliar nosso poder de influência num ano eleitoral?

Pois bem. Imagine-se diante da pessoa mais teimosa de seu convívio. A despeito dessa característica, trata-se de alguém que goza de excelente relacionamento com você.

Seu amigo, contudo, não dá valor às eleições que não sejam para presidente da república. E quanto às demais, na opinião dele é melhor optar por uma entre as seguintes opções:

a)A gente vota em quem já “está lá” (pois os outros candidatos “vão perder mesmo”);
b) A gente vota naquele conhecido (que é inteligente e, se ganhar, vai nos ajudar de alguma forma).

É bem provável que você já tenha tentado trazer mais consciência democrática para o seu colega. Talvez tenha procurado os melhores argumentos para, pelo menos, iniciá-lo em conceitos de responsabilidade cívica. Mas a teimosia do outro é um muro que parece ser mais forte a cada conversa.

Só que é justamente nesse ponto, leitor, onde sua boa vontade republicana se esvaiu para com o outro, que entra a estratégia de fazer perguntas.

Em algum momento de 2020 você vai falar de eleições com seu amigo. Pergunte como essa pessoa administrará seus votos. Assim que ouvir disparidades, faça perguntas. Tente chegar à raiz do argumento, ao invés de chocar-se com a feiura dos frutos ostentados orgulhosamente por outrem.

Respire fundo, e estimule seu companheiro a falar. Ao máximo. E justamente quando ele ficar tentado a convencê-lo a apoiar o candidato dele, mude um pouco sua estratégia.

Apresente ao seu amigo problemas políticos reais (e não, hipóteses) e relacione-os às perguntas que ainda fará ao seu conhecido. Lembre-se: os problemas aludidos precisam ter plena vinculação ao cargo sobre o qual vocês estão conversando (vereador e prefeito, nesse caso).

A tônica não é manipular outros. Longe disso. A expectativa é proporcionar certa oportunidade. Uma pessoa pode ser estimulada a prestar uma atenção maximizada ao pouco valor que ela outorga a algo muito mais valioso. Nesse caso é o valor da escolha de seu candidato a vereador e a prefeito.

Boa parte das pessoas com quem travarmos esse tipo de diálogo não passará a dar nova importância às eleições. Simplesmente existem aqueles que não se importam com nada além da própria sobrevivência. Suas famílias, amigos, empregos e formas de se divertir são todo o universo que conhecem – e querem conhecer.

A despeito desse desperdício de potencial, é indispensável respeitar quem também vive assim. Quando respeitamos a dignidade humana conseguimos conviver bem com quem não tem as mesmas opiniões, gostos ou visão de mundo que nós.

Se você for sincero e inteligente no ato de inquirir pode contribuir muito na evolução republicana dos que o ouvem. Pessoas podem desenvolver senso de dever, de responsabilidade e cidadania com sua ajuda.

Só não ceda à tentação de manipular os outros para votarem em quem você quer. Afinal, o tempo pode mostrar que você também votou mal. Apenas respeite seus ouvintes e utilize a arte dos questionamentos para fazer do outro uma pessoa melhor.

Imagem: https://pt.sainte-anastasie.org/articles/psicologia/en-qu-consiste-la-pregunta-milagro.html